*Por Andrey Costa
É quase tempo de férias no Hemisfério Norte. Se, no Brasil a discussão agora é sobre a possível opção (opção!?!) de o trabalhador abrir mão do descanso remunerado, lá fora é condição sine qua non o dolce far niente durante o recesso de trabalho, tão inquestionável quanto Marilyn Monroe ser loura. Sabendo disso, nesta época as brands se garantem na turma do jet-set, que continua fazendo questão de esturricar a pele nos balneários de luxo mundo afora, dando continuidade ao movimento que pôs no mapa a Riviera Francesa há quase 150 anos atrás. De olho nisso, ÁS embarcou nessa viagem com as labels, rodopiando o globo em busca das coleções que andam marcando presença quando o assunto é a temporada resort 2020. Confira o Top 10 das Cruise Collections.
Chloé
Órfãs do estilo Phoebe Philo na Celine (sem acento, rs), attention, si vous plait! Já podem voltar seus olhos à Chloé. A estilista Natacha Ramsay, que adora a levada de Phoebe, segue dando vida a coleções consistentes. É bom lembrar que a moça passou pelo Studio Berçot e depois trabalhou 15 anos com Nicolas Ghesquière (de quem foi braço direito na Balenciaga e Louis Vuitton), até assumir em 2017 a marca que é sinônimo de resort luxo. Dessa vez a sua praia é Xangai, na China. Com um squad de modelos locais a passarela foi tomada por peças de leveza sofisticada arrematada por um styling meticuloso, que lançou mão de bolsas, lenços e joias, ou seja, aqueles acessórios que por si só já dariam poder à produção, e que vendem a rodo, fazendo as moedas tilintarem feito ouro nos cofres da grife.
Tudo elevado ao cubo pela alfaiataria, carro-chefe da marca, e as estampas pictóricas dos vestidos, em sua atmosfera “bem menininha”, com um quê de chinoiserie. Destaque o equilíbrio das cores fortes e para a praticidade: sem espaço para fazer modinha rebuscada, amor, nada de pouco usual. A marca, apesar francesa, quer vestir uma Mulher-Maravilha de Paris à Xangai, e por aí vai…
Max Mara
O diretor criativo Ian Griffiths, aposta no match entre David Bowie e Marlene Dietrich na coleção cruise 2020 da Max Mara. O Neues Museum, em Berlim, foi o palco da cerimônia, que além de ser cenário para esse mix de inspirações, ainda celebrava o aniversário de 30 anos da queda do Muro de Berlim. Alô, alô, Trump! Entendeu o recado, amorzinho?
Com uma coleção em tons glaciais – crus, gelos e brancos para esquimós frajolas amarem -, rapidamente quebrados por tons fortes, como o carmim, a marca que leva a fama de sempre botar para jogo uma alfaiataria estruturadinha alongou a silhueta genderfluid. De que forma? Bom, com a maestria sexy-agênero que tanto Lorde Bowie quanto Fraulein Dietrich dominavam. E aí faz todo sentido juntar os dois ícones no mesmo balaio, sem farofa: cada um a seu tempo foi símbolo master de androginia. Highlights da coleção: trench-coats acinturados como convém a este clássico da moda, mas com laçadas, tricôzinhos, joias espetaculares e os cintos, que fizeram bonito no arremate de clochards, contracenando com a presença sutil da transparência em segundas peles noventinhas.

Foi lançado um novo casaco durante a cruise collection da Max Mara, chamado de “Berlin Coat“, de lã branca e flores bordadas nos ombros – uma homenagem à famosa porcelana Meissen, ex libris do artesanato alemão (Foto: Reprodução)
Gucci
Os Museus Capitolinos, em Roma, foram a escolha de Alessandro Michele para receber sua mais nova coleção para a Gucci, lugar que atiça a memória afetiva do estilista que, quando criança, costumava visitar o local com seu pai aos finais de semana. Eslisia sempre curte eleger uns lugares da tenra infância para criar storytelling, não é mesmo? Eles amam, os assessores de imprensa ganham munição para escrever os releases e o público se diverte. Nessa pré-temporada, sua modinha pagã, ciganinha, quis enaltecer o poder da escolha. Essa, de tão poderosa, acabou escorregando para todos os lados, quase saindo dos trilhos, ui! Uma visita a um brechó de luxo, em Londres, que terminou num mergulho de cabeça em tudo aquilo que há para vestir, atravessando o século 20, como um supermercado de estilos, um caleidoscópio de eras fashion, um almanaque das décadas. Tipo librianinho(a) com ascendente em gêmeos e lua em capricórnio, que não sabe o que tirar do closet.
Mas na mesma passarela, o trenzão da coleção encarrilhou novamente, e seguiu a rota certa quando adentraram as estampas “My body, my choice” e “22.05.1978”, data que, na Itália, entrou em vigor a lei para a proteção social da maternidade e do aborto legal. Que disse que moda não é engajamento, darling? Inclusive, alguns vestidos da coleção tiveram o útero bordado na região da virilha. Afinal, choices. Nada é clean, nada é minimalista, ao contrário. Michele parece estar construindo a ponte de sobrecarga emocional pela qual ele pretende atravessar esse dândi contemporâneo ou essa bruxa setentista, rumo a um futuro interessante.
Prada
Parece história da carochinha: numa temporada em que as labels fazem questão de repaginar os anos 1970, 1980 e 1990, a Prada insiste em borrifar no resort 2020 ares de sabonete Phebo e Seiva de Alfazema, sem cheiro de naftalina. Apesar da sua eterna releitura de peças que as vovós costumam gostar mais – a tirar pelas fivelas de cabelo nos coques, casaquinhos estruturadinhos para aquecer inverno, cachecóis em tricô e uma alfaiataria delicadinha -, o respingo de modernidade veio. No fundo, o frescor sempre vem. Afinal, quem nunca saiu de casa parecendo ter sido vestido(a) pela mamãe e deu aquela estilizadinha basiquete the flash no look, pelo caminho, para ficar com cara própria e antes de ser vítima da zoeira da turma? Ver a poderosa Miuccia Prada, diretora criativa da marca, fugindo do desespero criativo é mesmo delicinha visual.
Jonathan Simkhai
Modelos à prova d’água: no calçadão da praia de Bondi, em Sydney, o pôr do Sol se misturou à moda de Jonathan Simkhai para o resort 2020. Numa passarela perigosíssima, assim como a fauna selvagem local (tubarões, águas-vivas gigantescas e crocodilos de água salgada são habituês da orla australiana, medinho!), as modelos desdobraram-se para se equilibrar e despistar a maresia, sem perder a pose, nem carão. Tudo isso para que o foco não saísse da refinada coleção de um estilista que costuma fazer uma moda praia sem muitos insights criativos, mantendo assim uma clientela fiel. Pois bem, não é que funcionou?
À beira-mar, itens se desdobravam em blusas de cashemere tingida, tops de seda cujas mangas explodiam em cores, vestidos diáfanos com acabamento em renda, saídas de banho em cetim e até vestidos-tailleurs em tons mais fechados para clientes menos ousadas. E os acessórios? Todos sonho de consumo: Sandálias Manolo Blahnik com amarração em seda, earcuffs e argolas usados em todas as modelos, parceria com a designer de joias Lisa Corbo. Ah, e os óculos-sensação da estação, collab com Oliver Peoples!
Chanel
Lembram da edição Barbie fashion fever? Virgine Viard foi além e repaginou hits de temporadas anteriores da Chanel de Karl Lagerfeld, no Grand Palais, em Paris. As maxi-botas brancas da coleção de inverno 2006 encurtaram e as roupas ganharam acessórios dignos da boneca mais famosa do globo. A paleta de cores dos vestidos, macacões e conjuntinhos em tweed, diferente da temporada de outono-inverno 2020 da label (veja aqui), foi suavizada. A recém-promovida diretora de criação investiu nos pasteis. Apenas vez por outra explodiu no Pantone forte: roxo, azul, coral, verde ou pink. Logomania estampada em praticamente todas as calças e casacos e muitos laços; afinal, o Kaiser segue sendo a principal referência na bússola criativa na qual Viard se norteia.
Aje
Momento poesia: a flor da árvore de goma ou gumnut flower – acácia amarela – e as suaves cores da natureza australiana, serviram para que Edwina Forest e Adrian Norris criassem uma coleção-jardim para o resort da Aje. Foi como a dupla buscou suavizar a agreste terra dos cangurus, dingos, casuares, ornitorrincos venenosos e até a temível mamba negra, cuja picada é passaporte sem escala para o nirvana. Eles modelaram tudo com base na flora local e acabaram reinventando a mulher-flor surgida no Art Nouveau. A brincadeira rendeu uma espécie de Belle Époque tropical, com vestidos delicadinhos em tons clarinhos e mangas bufantes que explodem em cores e formas, além de plissados geométricos que dão vida às flores do lugar, rendendo um passeio pelo bosque (existe isso no outback?), durante o Mercedes-Benz Fashion Week Australia.
Louis Vuitton
Penteados victory rolls no estilo pin-up, blush cartão e muito ombro. A Louis Vuitton de Nicolas Ghesquière aterrissou no emblemático terminal de voos TWA Flight Center, fechado há quase vinte anos, no caótico aeroporto JFK, em Nova York, para apresentar a sua cruise collection 2020. Embebida de referências aos sixties, do filme “Speed Racer” às heroínas de quadrinhos como a Mulher-Gato e aos anos 1980 (hey, honey, Gloria Coelho, câmbio, do you copy?), as peças são de dar nó nas ideias. Assim como a cruise collection 2017, apresentada no Museu de Arte Contemporânea – MAC, em Niterói, os grafismos seguem rendendo,agora mesclados às aplicações de plumas. Causam salivação as jaquetas de couro estruturadas, as calças de alfaiataria acetinadas e vincadíssimas.
O devaneio futurístico dessa vez se deu numa bolsa, carro-chefe de vendas da marca, chamada de “Canvas of the Future”: protótipo de telas moldáveis e flexíveis feito de tecnologia AMOLED – as mesmas luzes de LED encontradas em alguns smartphones. O objetivo, de acordo com um comunicado de imprensa da Louis Vuitton, é explorar os limites entre seu smartphone e sua bolsa.
Dior
No Palais Badi, na amada Marraquexe de Yves Saint Laurent, a estilista Maria Grazia Chiuri apresentou seus modelos resort 2020 da Dior. Uma homenagem ao estilista que trabalhou sob a tutela de Christian Dior na maison francesa, lá pelos anos 1950? Maybe, but not it all. O norte de Maria Grazia foi precisamente a cidade, que além de ter sido a segunda casa de YSL (hoje atração turística, Jardim Majorelle), está no DNA da label por causa do designer. Problematizadores de plantão, helloooo! Já podem se acalmar, já que de apropriação cultural a coleção passou longe, okay, mores? Apesar de ser um ode ao savoir-faire africano, a visão eurocêntrica de tal cultura foi supervisionada por uma antropóloga chamada Anne Grosfilley, que apontou detalhes importantíssimos na concepção das peças: foi usada uma técnica de impressão feita à mão que forma a padronagem, trabalhada na criação de casacos, vestidos e macacões. O jeanswear comparece em várias ocasiões, trazendo a leveza e jovialidade à marca que, de tão tradicional, sempre nos deixa ansiosos por inovação.
Johanna Ortiz
No recém-inaugurado restaurante Four Seasons, em Nova York, a colombiana Johanna Ortiz levou sua moda off-season a outro patamar. Nada de saídas de banho luxuosas ou moda praia festiva, aposta de muitas marcas nessa pré-temporada. Ao contrário, as modelagens foram exploradas ao extremo com vestidos-babado, mangas bufantes e cinturinha afinadíssima, do tipo que faria Daiane Conterato invejar uma vespa. Latina, baby! A estilista misturou seus vestidos com botas western, criando uma mistura interessante que globaliza suas peças, famosas por vestir mulheres sexys e modernas. Fecha com chave de ouro o Top 10 resort 2020 do Ás na Manga. Con mucha honra, aliás!
Deixe seu comentário