Em cartaz nos cinemas, Artista do desastre(Artist of Disaster, New Line Cinema e outros, 2017) é filmaço que fala de filme ruim que virou cult. Parece estranho? Um pouco. Bem cotado no Globo de Ouro no início do mês, inclusive para  “Melhor Filme – Comédia ou Musical’, só não saiu de mãos abanando porque o longa dirigido e estrelado por James Franco deu a este uma merecida estatueta de ‘Melhor Ator em Comédia ou Musical’. De lá para cá, o astro foi acusado de assédio sexual e a Academia, moralista que não separa obra de vida privada, acabou esnobando a produção entre os indicados ao Oscar. Isso não impede, claro, que o público deguste essa pequena pérola que fala da linha tênue que permeia o sucesso e o fracasso.

(Foto: Divulgação)

Em “Artista do desastre”, James Franco vive o personagem real Tommy Wiseau, que acabou ficando famoso em Hollywood por ter feito “o pior filme de todos os tempos”, espécie de Ed Wood do novo milênio. O ator e diretor bancou seu sonho do seu próprio bolso, gastou milhões, perdeu uma fortuna e acabou entrando para os anais do cinema como exemplo de criatura equivocada que vai na contramão da indústria e se mostra visionário, fugindo do lugar comum (Foto: Divulgação)

Filmado em parte como se fosse documentário, em parte assumindo descaradamente a ficção, é nesse barato do mockumentary – ficção que simula documentário, daí o mock”, que significa simular – que Franco e seu companheiro de todas as horas Seth Rogen transitam bem, como já fizeram em outras parcerias como A Entrevista (2014) e ‘È o fim (2013), dividindo ou alternando funções na direção, roteiro e produção e quase sempre atuando.

Na narrativa, a equipe técnica e elenco de “Artista do desastre” (com Seth Rogen ao centro) ficam aturdidos inúmeras vezes com o comportamento bizarro de seu contratante Tommy Wiseau no set, proporcionando ao público impagáveis cenas de humor. A maior graça do longa-metragem é justamente o contraste entre a postura que se esperaria de alguém em ação em Hollywood e a personalidade única que o protagonista insiste em manter (Foto: Divulgação)

Confira abaixo o trailer legendado (Divulgação): 

Além de interpretar, Rogen também é um dos produtores dessa realização que traz participações especiais de Zac Efron, Josh Hutcherson, Melanie Griffith, Danny McBride, Kristen Bell, J.J.Abrams, Kevin Smith, Christopher Mintz-Plasse e até Sharon Stone. Sim, como num longa de Woody Allen, fica bem na fita aparecer em um filme da dupla Franco-Rogen.

Irmão de James Franco na vida real, Dave Franco é o verdadeiro protagonista de “Artista do desastre” e interpreta o aspirante a ator que se vê dividido entre a amizade sincera por Wiseau e a necessidade de fazer o jogo de Hollywood para entrar no mercado.  O ator de 32 anos, que tem carreira própria embora bem menos conhecido do grande público global, mostra boa química atuando ao lado do parente mais velho (Foto: Divulgação)

Ao narrar com bastante sinceridade e muito humor o périplo real de um aspirante ao estrelato, o diferentão, esquisitão e barroco Tommy Wiseau (Franco), e de seu amigo Greg (Dave Franco, irmão do primeiro e igualmente ótimo) para por de pé seu próprio filme (The room, de 2003), usando sua fortuna pessoal sem ser render aos mecanismos da indústria, a narrativa é um soco no estômago.

James Franco andou posando ao lado do verdadeiro Tommy Wiseau – quase uma curiosidade de quermesse -, no backdrop de diversas celebrações do cinemão e em exibições de “Artista do desastre”. É pitoresco ver o quanto o cineasta independente, que se tornou famoso com o fracasso do seu “The Room”, acabou ficando conhecido do grande público justamente pelo sucesso de sua trajetória narrada nesta produção de Franco, astro que pertence ao mainstream, mas que insiste em se manter autoral como diretor e produtor, remando na mesma maré que Wiseau, só que com mais sorte e, no caso de Hollywood, tendo o mais importante: com bem mais estampa! (Foto: Divulgação)

Se na temporada passada de filmes era La la land – cantando estações (2016) que se encarregava de revelar as entranhas de Hollywood enquanto indústria cultural, dessa vez é “Artista do desastre” que cumpre essa função, só que de forma nada romântica, muito mais visceral, com toda as possibilidade de catarse que somente o riso permite.

Umas das características mais marcantes – e divertidas – de Franco em sua composição de Tommy Wiseau é sua risada disléxica e ridícula, tão natural para ele quanto artificial e canastrona para quem vê. O astro está genial no papel que lhe concedeu o Globo de Ouro (Foto: Divulgação)

Ao mostrar como o retumbante fracasso de “The Room” acabou revelando qualidades insuspeitas com o passar dos anos até virar um produto acabado com personalidade própria e forte teor autoral, “Artista do desastre” dá conta do recado revelando o quanto somos todos conduzidos ao lugar fácil das opiniões pasteurizadas pela mídia e dos preconceitos pré-estabelecidos. Nessa hora, depois de tanto rir das peripécias de Tommy Wiseau, no final resta apenas o sorriso amargo de perceber o quanto, em nossas vidinhas ordinárias repleta de achismos entranhados em nossas cabeças pelo senso comum, somos nós os idiotas – bem mais que ele que, de “cineasta que fez o pior filme de todos os tempos” se tornou “visionário”, com o nome devidamente registrado para a posteridade nos anais da Sétima Arte, nesta tão obstinada quanto equivocada, mas genuína jornada para realizar seu sonho.

Ao apresentar Tommy Wiseau como um personagem ridículo, mas em sua ingenuidade corajoso por seguir seu próprio instinto, “Artista do desastre” faz o caminho inverso revelando o quanto as entranhas do sistema hollywoodiano, no fundo, é uma patética fábrica de fórmulas prontas para a fácil digestão e lucro exorbitante à custa da mediocridade (Divulgação)

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