É senso comum que uma marca de moda se empenhe em, a cada temporada, revisitar seus códigos aprimorando o conjunto da obra para reforçar a sua identidade. No contraexemplo das labels estrangeiras, onde a dança das cadeiras na direção criativa virou algo tão comum quanto a busca pela modernização de seus repertórios, a moda nacional segue famosa pela quantidade de estilistas que, mesmo na adversidade, decidem manter-se firmes no escopo da criação. Sorry, LVMH, Kering, entre outros. Porém – e ainda bem! -, o exercício da reinvenção por aqui permanece vibrando através dos nossos criativos, e não seguindo os ditames de gélidos departamentos comerciais… No caso da Martins, comandada pelo designer Tom Martins, esse diálogo da reinvenção, sem obsolescência ou repetição, flui naturalmente. A coleção “Synesthetic“, apresentada no quarto dia do São Paulo Fashion Week (SPFW) pode ser dividida em dois blocos, ambos enviesados pelo estilo rocker da marca, mas atendendo a proporções e desejos diferentes. Quem não conhece a Martins pode até estranhar a brusca ruptura entre as peças apresentadas nesses dois atos, mas, ao entender que o consumidor da marca faz parte de um público plural, essa equação é solucionada em instantes.
Tão delicioso quanto o styling poderoso da apresentação, parceria com o duo de stylists Cacau Francisco e Anuro Anuro, foi ponto de partida o encontro entre o mood glam e o punk essa composição de prints, tecidos e silhuetas, que pretendem atender tanto a turma desinibida quanto a mais conceitual que prefere volumes, Seapunk é pouco, mas as referências eram nítidas: a Pequena Sereia, os marinheiros de Coco Chanel e Jean Paul Gaultier e o rock pesadão!
A gente até se lembra daquela plataforma ou coturno guardado no fundo do closet, ou desenterra aquela camisa de flanela do guarda-roupa após conferir a psicodelia da grife, que mergulhou neste universo punk rock ao mesmo tempo, em que desceu às profundezas marinhas, por que não? Tudo isso aditivado por cores fantásticas, a cara da marca.

O batidão fashion ainda contou com a presença do casal de globais Agatha Moreira e Rodrigo Simas, que envergaram peças oversized, marcadas pelos aviamentos statement que Tom sempre aposta: zíperes pesados usados como decoração de produto, cordões compridos para ajuste da peça, estamparia abstrata, fitas com pontas soltas e por aí vai. Falando em estampas, o padrão maximalista feito por meio de IA, que contava com uma variedade de animais e elementos marinhos, foi destaque, assim como a série com vestes formadas por patches de logos de bandas de punk rock, tipo The Runaways e Sex Pistols, dispostos de modo caótico.

O risco da aposta em tantos prints, listras, xadrezes grunge, comprimentos, sobreposições, tecidos e recursos de styling – tudo junto e misturado! –, fez com que tudo parecesse mais especial, provocativo e atento ao redor. Deu certíssimo. Preservado o caráter disruptivo da marca (nada soa fake aqui), boas novidades vieram à luz, como essa dicotomia deliciosa de mostrar e esconder tudo em todo lugar ao mesmo tempo. Por mais coleções assim em uma semana de moda que demonstra estar recuperando o vigor.
Confira abaixo a coleção completa (Fotos: Zé Takahashi/ @agfotosite/ Divulgação):




































*Por Andrey Costa
Foto destaque: Divulgação
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