“Diversidade, gays, trans, travestis, transcultural, marginal!”, salve Débora, a top dos falsetes! Salve o SPFW! Acaba de encerrar a 48ª edição da São Paulo Fashion Week, que dessa vez teve como sustentação a acessibilidade, inclusão, discussão de gênero, a pauta sustentável. Tudo junto e misturado, do midiático ao básico, nunca desnecessário, que fique claro. Por exemplo: em parceria com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento de São Paulo, a semana de moda aderiu ao programa Tem Saída, que cuida da inclusão de mulheres em situação de violência doméstica, presentes nessa edição do quadro de monitoras do evento. O SPFW também fez outra dobradinha com a Secretaria Municipal de Cultura através do Programa Jovem Monitor, que atende anualmente 300 jovens entre 18 a 29 anos, garantindo 54% das vagas à juventude negra da cidade, que atua na macrorregião de Sampa. Belezura. Eles todos já desenvolvem alguma atividade artística. E o foco? O programa é exatamente o aprimoramento e formação. Sim, o agito continua sendo a principal plataforma para lançamentos de moda na América Latina, mas expande tentáculos rumo a questões sociais prementes que extrapolam a passarela. Como ÁS não dá ponto sem nó, fomos até elas: as minorias presentes da badalo fashion. O objetivo? Ué, saber como se enxergam nessa passarela plural. Munido de muito verbo para soltar, todo mundo quis dar a sua opinião, óbvio. Confira abaixo!

Um público plural confere o desfile do novo designer Victor Hugo Mattos no Projeto Estufa, na 48ª edição do SPFW. Sim, a fila anda no SPFW: há apenas um ano de comemorar 50 edições, a maior semana de moda da América Latina solidifica a sua posição a favor da diversidade, se renova no casting de grifes e afirma definitivamente sua potência enquanto plataforma inclusiva, visivelmente contrária à onda conservadora que tem ganhado espaço no Brasil e no mundo (Foto: Reprodução) (Foto: Fotosite: Divulgação)
Sam Porto, 25, é o modelo recordista de aparições na 48 edição da SPFW. Há dois anos trocou Brasília pela capital paulista afim de se lançar no mercado. Deu certo. Seria apenas mais um na imensa listas de Cinderelas e Cinderelos fashion, não fosse uma questão: Sam é trans, menina que se sentia menino e virou menino. Vingou. Foi o maior sucesso dessa temporada no quesito modelo. Sobre essa reviravolta em sua vida – e no evento -, o rapaz é categórico: “Estou bastante surpreso com o SPFW em relação às meninas trans que já desfilaram. Elas vieram com tudo, em todos os perfis, isso diversifica mais ainda. Já em relação aos meninos trans, que é o meu caso, é de uma responsabilidade imensa ser o único a desfilar. Então, levanto essa bandeira com muito orgulho, sabendo que ainda falta uma longa estrada a percorrer até que, um dia, eu não seja apenas o único homem trans a desfilar, sobretudo sendo branco, o que acaba me conferindo mais privilégios”, finaliza o moço, que também é tatuador e andou arrancando suspiro de todos os gêneros e orientações sexuais pelos corredores do Ibirapuera.

Recordista de desfiles nesta temporada do SPFW, Sam Porto é minoria que virou mainstream (Foto: Andrey Costa para Ás na Manga)
Jaqueline Ramirez, 35, drag queen xamânica, problematiza com propriedade: “A indústria da moda está cada vez mais preocupada em incluir minorias para não ficar para trás, mas ainda não vejo isso de uma forma totalmente positiva. Precisamos analisar, essa situação com cautela e a longo prazo. A curto prazo é legal, mas, sem essa análise podemos nos deparar com uma forma de se apropriarem de uma ‘modinha’ apenas se obter likes. É o que chamo de “tokenismo”, quando um indivíduo é pego de exemplo para representar um todo que muitas vezes é omitido, apenas para vender a imagem de que a marca em questão é inclusiva, quando na verdade não é”.
Preocupada com um possível oportunismo inclusivo, usado como bola da vez, ela completa, disposta a não se tornar mera curiosidade num ciraquinho de variedades fashion: “A gente vê de fato muitas minorias representadas na passarela, mas dentro desse espectro LGBTQI+, temos que pensar nas pessoas trans, principalmente nas travestis. Durante o ano, as marcas nos chamam para fazer trabalhos? Nos empregam com todos os direitos cabíveis? Temos que nos atentar a isso”, finaliza, digníssima.

Sem misturar alhos com bugalhos, a drag Jaqueline Ramirez celebra a abertura da diversidade no SPFW, mas questiona quanto a um possível ativismo de fachada pelas grifes, somente para render mídia (Foto: Andrey Costa para Ás na Manga)
Watson Souza, 24, é ator e circulava pelo evento todo closeiro, antes de ser abordado pelo ÁS para falar sobre o assunto. Se de fato ele se sentiu representado na edição, ele conta: “Nas passarelas, nos corredores, em tudo! Estou surpreso com a naturalidade com que as pessoas estão se mostrando. Acredito que a moda sem gênero vai se consolidar, até porque o momento pede essa imposição por parte das minorias. Vi o desfile da Apartamento03 e estou boquiaberto, até agora, com a forma com que fluiu o genderfluid“.

De modelito safári pelos corredores do SPFW, Watson Souza assumiu postura explorer afim de investigar a fluidez de gêneros no evento (Foto: Andrey Costa para Ás na Manga)
Já Michele Fernandes, 35, é empresária responsável pela Boutique de Criola, marca que mira na cultura afro-brasileira. Ela procura elevar a autoestima de mulheres negras ao redor do mundo e comemora: “Finalmenteeeeeee!!! Sinto que agora não é balela! Estamos de fato sendo representados, fazendo acontecer e atraindo os olhares de uma forma sincera.”, finaliza.

Com camiseta digna de um Pantera Negra Kraftwerk, Michele Fernandes, da Boutique de Criola, se sentiu representada numa edição em que os modelos negros foram maioria e a top principal foi afro-brasileira Mariana Calazan (Foto: Andrey Costa para Ás na Manga)

A top Mariane Calazan (foto) fechou do desfile de Lino Villaventura no SPFW. A modelo foi a segunda colocada no ranking desta 48ª edição, com 12 desfiles, atrás apenas de Nayara Oliveira (13 desfiles). Isadora Oliveira (11), Elle Maciel e Raynara Negrine (10 desfiles, cada) completam o Top 5 feminino e todas são afrodescendentes. Entre os homens, o recordista foi Sam Porto (9 desfiles), seguido de Felipe Rocha, Dries Van Steen, André Martinez e Ariel Bernardes, segundo a organização do evento ((Foto: Zé Takahashi/ FOTOSITE / Divulgação)
João Macrae, 23, é o colaborador do site Arlindo Gründ que abre o verbo: “Senti muito orgulho em fazer parte de uma edição épica, na qual as marcas novas são de pessoas negras e ativistas. Me senti pleno vendo pessoas trans e não-binárias fazendo parte do casting de marcas poderosas. E mais feliz ainda conferindo o Projeto Estufa trazer acessibilidade para pessoas com deficiência visual. Termino mais uma semana de moda com muita alegria, com a sensação de que existe, sim, esperança na humanidade. Mas, claro, há muito para ser feito para que todas as pessoas se sintam acolhidas no SPFW”, finaliza o maquiador.

De saia ou vestidos e todos os dias do SPFW, João Macrae é do tipo que foi pego de calças curtas pela diversidade: o rapaz que é maquiador comemora a amplitude plural da semana de moda (Foto: Andrey Costa para Ás na Manga)
Estilista com good vibes Sailor Moon, Alex Santos, 28, dispara: “O SPFW caminhou muito para chegar até aqui. Não foi fácil. Hoje é possível até um deficiente visual ou cadeirante participar de um desfile, algo antigamente era impensável.”, finaliza o moço todo Neo Ziegfeld Follies, com seu penacho na cabeça. Funny Brice é pouco!

Funny Girl do novo milênio: Alex Santos comemora o atual estágio inclusivo do São Paulo Fashion Week, dentro e fora da passarela (Foto: Andrey Costa para Ás na Manga)
Karina Izidoro, 26, já trabalhou com o estilista Isaac Silva, designer que privilegiou negros, trans e as religiões africanas no seu fashion show carregado de axé. Por ele, a moça rasga aquela seda: “O Isaac é baiano, negro. E me deu a oportunidade de trabalhar com ele. O mais me afetou, no bom sentido, foi ver na passarela um casting que incluía o negro, o trans, o gay, o gordo. Apesar disso, há um longo percurso ainda a ser feito. Estamos batalhando para chegar o dia em que subir um modelo negro na passarela seja tão corriqueiro quanto chupar picolé na praia, e não algo pontual, que mereça aplausos. Tem que fazer valer palmas quando for algo simplesmente natural”, manda na lata a visual merchandiser.

Karina Izidoro deseja a presença de negros na passarela tão natural quanto tomar banho (Foto: Andrey Costa para Ás na Manga)
Yasmin Feitosa, 23, é outra visual merchandiser. Entusiasmada, ela metralha: “Tô amando! A gente, que sempre foi excluíd(o)a da sociedade por ser negr(o)a, agora pode mostrar de fato como somos. Essa temporada nos fez perceber que estamos unidos e há uma maré boa nos guiando para estejamos aqui, ocupando nosso espaço”, finaliza.

Yasmin Feitoza é enfática quanto à ocupação efetiva dos negros na sociedade (Foto: Andrey Costa para Ás na Manga)
Calvin Klein celebra seu meio século com festa no Brasil, Pablo Vittar e convidados em sintonia fina com a diversidade do SPFW:
Quando se pensa em CK, emergem no imaginário muito jeans, underwear, Brooke Shields, Mark Mark & Kate Moss, Christy Turlington, as campanhas icônicas clicadas em P&B por Bruce Weber, a consagração do abdômen tanquinho e, mais recentemente, Justin Bieber turbinadinho por um photoshop amigo. A label sempre foi transgressora para vender jeanswear e cuecas, pero no mucho. Por isso, o agito que dominou a Vila Madalena, em Sampa, durante o SPFW, surpreendeu. Em meio aos arroz de festa de sempre, um time de bonitos e bonitas bem padrãozinho e um som de primeira, a festa que teve como peça de resistência a presença de Pabllo Vittar se transformou num verdadeiro catálogo de criaturas freak da mais alta cepa, como manda o figurino atual. Tudo no melhor conceito darwiniano, afinado com o que se viu na passarela e entorno da semana de moda. Classificação das espécies? Bom, nem sempre foi possível, mas que foi bem divertido, foi. Confira abaixo!

Com unhas azuis tão longas quanto o Eurotunnel e top cropped CK, Pabllo Vittar fez o esperado: closou, posou, backdropou, selfiou para os outros, todos a postos prontos para tirar casquinha da moça. A artista cumpriu o protocolo, exalou simpatia e depois vazou. Nem precisava ficar mais. Embaixo, a pista virou uma espécie de Arca de Noé eletrônica, com espécimes tão variados que iam do it-boy Vini Uehara a Hugo Gloss, regados a drinques, Haagen Dazs e pipoca (Fotos: Divulgação)
Confira abaixo quem tornou o cinquentenário da CK no Brasil um panorama da divertida fauna paulista (Fotos: Divulgação):
[wonderplugin_gallery id=”184″]
Deixe seu comentário