“Verão 90” estreou na televisão e é sucesso. ÁS estava lá, viu a internet surgir, a fita-cassete, o EP e o LP serem exterminados pelo CD, as drag queens virarem establishment, os DJs mainstream e a moda mudar completamente seu rumo… Ah! Como tudo mudou! Ainda inebriada pelos resquícios do exagero oitentista, em pouco tempo a década assistiria assombrada o advento do telefone celular, a consolidação da globalização e o estrelato de John Galliano para, pouco depois, se tornar testemunha ocular do reinado das Spice Girls, no meio, e de Gisele no finalzinho. O minimalismo ganharia espaço em contraponto à megalomania da década antecessora, Erika Palomino misturaria no mesmo balaio moda e bafão, os padrões de beleza seriam questionados por uma modelo inglesinha-problema e seu namorado Johnny Deep seria alçado ao posto enfant terrible nas telas. Tudo isso, logo após o mundo sacolejar ao som dos ritmos latinos, de Ricky Martin a Loelwa Braz. Portanto, nada mais justo esse Top Ten 1990 desses dez anos que antecederam o milênio. Confira!
1) Madonna catapulta Dolce & Gabbana

Capa do lead single ‘Justify My Love’ retirado da primeira compilação de Maddie, o álbum ‘The Immaculate Collection’ (Foto: Google Images)
Hoje em dia, é comum vermos artistas pop metidos a ícones fashion. Mas, voltando quase três dezenas de anos atrás, era Madonna uma das maiores influenciadoras numa época anterior a influencers. Digital mesmo era o seu polegar de ouro que transformava em desejo tudo o que a moça tocava. Não havia pudor, e a musinha adorava (ainda ama!) o burburinho causado pelas roupitchas. A amizade com Domenico e Stefanno é mantida até hoje e, vai e vem, rola campanha para a marca com a estrela do pop.

Animal print de uma parceria animal: Madonna solta a jaguatirica ao lado de Domenico Dolce e Stefano Gabbana (Foto: Google Images)
Confira abaixo o clipe de Madonna “Justify My Love” (Divulgação):
2) O designer inglês Neville Brody reedita/renova o construtivismo gráfico russo e, na esteira da queda do Muro de Berlim, define a estética visual das publicações fashion moderninhas
No início dos noventa, Brody foi o papa dos projetos editoriais gráficos de revistas de moda com a pecha de inglesas, tipo The Face e i-D. Quem queria causar no estilo, andava com pelo menos um exemplar dessas brochurinhas popzinhas debaixo dos braços, repletas de novas fontes de letras, de brincadeiras estilísticas que só fazem sentido para que frequentou as salas de aula de cursos de programação visual, como “condensação” e “extensão” de fonte ou nomes pomposos para famílias de letras batizadas com alcunhas como Copperplate Gothic Bold.
No contraponto, as edições Sportswear Los Angeles e alemã assumiriam o visual turbinado da MTV, tendo como ícone a beleza curvilínea de Cindy Crawford e de qualquer outra viesse na sua rebarba, como as tops Frankie Ryder e Helena Christensen.

Revistas The Face e i-D. Nas capas, as duas modelos ícones do estilo heroin chic,que enaltecia o visual drogadinho. Kate Moss (esq.) e Kristen McMenamy (dir.). Quando a recém-instaurada onda politicamente correta começou a pegar pesado com esse modismo, Kate, mesmo famosa pelas derrapadas na vida, continuou, mas Kristen foi engolida pelo furacão das tops com cara de saúde: a brasileira Gisele Bündchen, a russa Carmen Kass e a espanhola Esther Cañadas (Foto: Google Images)
3) A lambada conquista o mundo: com o sucesso global do Kaoma, Beto Barbosa e Sara Jane incendeiam o Brasil e Sidney Magal ressurge:
Confira abaixo o clipe de Kaoma – “Chorando Se Foi” (Divulgação):
Outro que estourou nos 1970 e se reinventou nos 1990, foi ele, Sidney Magal, que junto com uma trupe que incluía Beto Barbosa e Sara Jane, era a escuderia do ritmo que embalou o confisco da poupança e o Plano Collor. Figurinha garantida nos programas de auditório, graças às suas canções envolventes plenas de saracotico, Magal, com sua canção “Me Chama Que Eu Vou“, voltou às paradas, perdeu a aura brega e virou cult, ao lado de Beto Barbosa com “Adocica” e Sara Jane com “Vamos Abrir a Roda“.
Confira abaixo o clipe de Sidney Magal – “Me Chama Que Eu Vou”, hit instantâneo quando virou música de abertura da novela “Rainha da Sucata” (Divulgação):
https://www.youtube.com/watch?v=wyi9XfeplvI
4) Naomi, Linda, Cindy, Claudia, Christy: Surgem as supermodelos!
Quem viveu simplesmente sabe. Conhece esses nomes de deusa: Linda Evangelista, Naomi Campbell, Claudia Schiffer, Cindy Crawford, Christy Turlington, Stephanie Seymour, Carla Bruno, Nadja Auerman, Tatjana Patitz, Paulina Poriskova, Helena Christensen, Kate Moss, Eva Herzigova. Com Linda, Naomi, Claudia e Cindy na linha e frente, as supermodelos dominaram a cena e, a partir das capas de revista – e do clipe de George Michael “Freedom ’90“, que as transformou em celebs – deixaram de ser conhecidas somente no mundinho da moda para caírem nas bocas de Matilde. Viraram o suprassumo do espetáculo, sintetizaram com o showbizz, sobrepujando as estrelas de cinema numa época em que Hollywood ainda privilegiava gente como a gente, tipo Meryl Streep.

Supermodelos nos anos 1990: beldades dominam a cena, das passarelas ao mundo das celebridades (Foto: Google Images)
Confira abaixo o clipe de George Michael – “Freedom ’90” (Divulgação):
https://www.youtube.com/watch?v=diYAc7gB-0A
Em meados dos anos 1990, o cinema rapidamente reagiu: recrutou uma penca de ex-modelos que queriam ser atrizes, as verteu em estrelas, resgatou o glam nas telas: Uma Thurman, Cameron Diaz, Nicole Kidman, Catherine Zeta-Jones, Gwyneth Paltrow, Cate Blanchett, Scarlett Johansson, Charlize Theron. Elas começaram a roubar as capas de revista, por as cover girls para escanteio, A guerra ficou feia entre Paris e Hollywood. Aí, veio o golpe de mestre: a moda inventou Gisele.

Carade bebê: ainda modelo, uma anônima Uma Thurman posa para a Vogue, antes do sucesso, que veio a reboque na virada dos 1990 com “Ligações Perigosas” (Foto: Reprodução)
6) Rainha da Sucata: ultimate fight entre a cavaquinha e a lagosta no jantar das finas
Na TV, a audiência explode: é a primeira novela de Silvio de Abreu para o horário das 21h (que, então, ainda rolava às 20h), quando a televisão a cabo mal começava a engatinhar no Brasil. As emissoras abertas ditavam a moda. Não havia competição com o on-line; aliás, sequer havia a internet. Na narrativa, o duelo entre a sociedade emergente, montada no novo dinheiro mufufa a brotar com o pau, mas sem savoir vivre, e a tradicional sociedade quatrocentona paulista, plena de charme, mas comendo sardinha e arrotando robalo.
Nos respectivos papeis, a milionária cafona da Zona Leste Maria do Carmo Pereira (Regina Duarte), que se fez no meio dos ferros-velhos, e a maquiavélica Laurinha Albuquerque Figueiroa (Gloria Menezes), obrigada a engoli-la quando seu enteado Edu (Tony Ramos) – por quem é apaixonada -se casa com a primeira num matrimônio de conveniência.
Na vida real, a mídia se encarregaria pouco depois de criar a versão “real e carioca” do embate entre Maria do Carmo e Laurinha, quando contrapôs a milionária emergente do ramo de padarias Vera Loyola à icônica Carmen Mayrink Veiga.
7) Membros em riste: aditivado por Versace e pelo underwear masculino da Calvin Klein, o nu masculino se fetichiza na publicidade
Versace! Versace! Versace! Engana-se quem achava que somente o corpo feminino tinha direito a ter sua sensualidade. Fora do círculo gay – da cena clubber e de publicações eróticas como Honcho – , o macho man logo vira bibelô. Na publicidade, na moda, na vida. No universo de Gianni, os rapazes anabolizados com torsos depilados na base do Veet eram mais que meros Apolos e Mercúrios seminus: ao lado de poderosas amazonas, eram o segredo para vender mais! Deuses musculosos prontos a estimular o consumo, igualzinhos ao que Rose Di Primo já fizera pela mulher nos anos 1970, Monique e Luma nos 1980. O male appeal passa a dominar a publicidade.
Efeito semelhante acontecia no mundo das cuecas. No underwear da Calvin Klein, por sinal, que acabou ditando regra. Se Kate Moss foi a responsável pela mudança do padrão de beleza das passarelas dos anos 1990, ao estrelar campanhas para a marca ao lado de um dos astros do rap da época, contribuiu para lançar o rapper Marky Mark (hoje o Mark Wahlberg do cinema, leia mais aqui), da banda sensaçãozinha Marky Mark and the Funky Bunch. Kate já estava se tornando tudo de bom na moda mundial, mas foi Mark quem engoliu a moça com sua bad face e seu tanquinho.

Antes de depois: hoje cinquentona do tipo que ama um botoxzinho capilar, Demi Moore foi a síntese da descolada de cabelo curtinho na virada dos 1990, depois de fazer filmes adolescentes nos 1980 e até a filha teen de Michael Caine em longa rodado no Rio, com, direito a cena de macumba na praia (“Blame it in Rio”, 1985) (Fotos: Google Images / Reprodução)


Se Oliviero Toscani foi o homem que pôs a Benetton no mapa nos anos 1980, La Chapelle fez o mesmo pela Diesel nos 1990. Diga-se de passagem, com o kitsch, o camp e o cult. Suas campanhas viraram ao avesso imaginário da turma da moda, que dava frondosas gargalhadas diante dos anúncios publicados nas páginas da revistas ou em pôsteres que adornavam as lojas da grife, como o daquela mega store em frente ao Bloomingsdale’s, na Big Apple.
Pontos de venda tipo esse rapidamente se tornaram locais de encontro de fashionistas irreverentes dispostos a desembolsar muitas verdinhas em índigo vertido em artigo de luxo. Graças a imagens que traziam de velhinhas sapecas a fim de se dar bem com comissários de bordo bombadões a fashion victms atropeladas por hambúrgueres gigantes…
10) Will Smith é peixe fora d’água em ‘Um Maluco no Pedaço:
Bem antes de virar astro de filmes de ação, salvando o mundo no estilo Charlton Heston, Will Smith fazia rir em sitcom, Astro da TV de “The Fresh Prince of Bel-Air“, no Brasil “Um maluco no pedaço“, ele já tinha o bigodinho, mas o cabelo era Grace Jones. Ou MC Hammer. Na trama, ele era o garotão de uma família negra enviado pela mãe para morar com os tios ricos na preconceituosa – e rica – Bel Air, na Califórnia, quando o politicamente correto passava ao largo.

Will Smith em “Um maluco no pedaço”: os grafismos da vinheta de abertura são inspiração para a estética da nova novela da Globo, “Verão 90” (Foto: Google Images / Reprodução)
Nesse tempo, o moço nem imaginaria o quanto a vida lhe seria generosa: de magrelo, viraria negão malhado cheio de marra, poria alienígenas para correr em “Independence Day“ (1996), seria alçado ao posto de uma das maiores bilheterias do cinema, ingressaria no primeiro escalão, ganharia rios de dinheiro. E, mais tarde, ainda se tornaria o pai gente boa do filho Jaden, fruto da Geração Z, que ajudou a estabelecer a fina nova fronteira entre homem e mulher. Ou a ausência dela.

Will Smith, quem diria, já foi música fora do tom na Hollywood da qual hoje ele é um dos principais astros! No início de carreira, seu personagem “classe média” de “Um maluco no pedaço”, vindo da Filadélfia, contrastava com o ambiente high society de Los Angeles (Foto: Google Images / Reprodução)
Mas o bom e velho Will também pintava e bordava em outro meio nessa época: o da música pop. Nessa virada dos nineties, quando a MTV engatinhava na versão tupiniquim, o ator dava vazão à sua porção rapper fazendo dupla com o DJ Jazzy Jeff!
Confira o clipe do duo DJ Jazzy Jeff & The Fresh Prince – “Sumertime” (Divulgação):
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