O Rio tem Madonna, São Paulo Paul McCartney. Sir James Paul McCartney pôs o público no bolso nesse retorno à pauliceia, com shows nesta terça-feira (15/10) e quarta-feira (16/10), um ano depois da sua última passagem pelo Brasil. Nesses dois dias de espetáculo (e que espetáculo!) no Allianz Parque, o astro pop demonstrou o porquê de ter inventado, há quase 60 anos, ao lado dos parceiros de The Beatles, ao mesmo tempo em que Elizabeth Taylor e Jacqueline Kennedy, o sentido daquilo que viria a ser considerado, desde então, celebridade – fundamento do que se tornaria a argamassa para o livro “A sociedade do espetáculo” (1967), escrito pelo filósofo francês Guy Débord (1931-1994) e ainda hoje valendo.

Magnético, Paul não brinca em serviço. Obviamente ninguém espera que o artista, aos 82, faça acrobacias no palco como Madonna, nem que ele dê os pulos e corridinhas que definem Mick Jagger, como se tivesse o diabo na carne. Cada um no seu quadrado e, com certeza, malabarismo não é a sua praia. Mas, em esforço natural que vai ao encontro do antietarismo, o britânico cumpre seu papel com louvor, sobretudo quando se considera que gastou uma hora e quinze de passagem de som, em torno das três da tarde, para encarar, em seguida e sem parar, duas e meia de um show que começou com exatos 30 minutos de atraso programados para dar tempo de todo o público chegar. Rolam aditivos? Definitivamente, Paul é o Ney Matogrosso dos ingleses.

Seu milimétrico show é o que se esperaria de alguém que deve ter pegado muito trem na Victoria Station no passado, daqueles que saem criteriosamente em horário quebrado. Cada respiro para tomar fôlego, sem direito a beber água (como?!?) se concatena com as pausas para expressões faciais gaiatas, projeções em cena, as múltiplas trocas de guitarra, violão, ukelele ou bandolim (um vai-vem de instrumentos musicais), intercaladas com a presença no piano Yamaha. Tudo isso é a deixa para a endiabrada explosão de vídeos no telão combinados com efeitos de light design, criados pelo iluminador Leroy Bennett, de quebra, aliás, o melhor que ÁS viu em anos. O profissional sabe equilibrar como ninguém luz e vídeo em cena.


Artífice maior da revolução de comportamento dos sixties, em poucos minutos no palco Paul McCartney já brinca com o look, tirando o paletó do terninho completo Paul Smith, com gola de padre, para deixar a plateia extasiada ao vislumbrar o forro gráfico P&B. Sua relação com a moda não é de hoje, ainda mais quando se leva em conta a importância que os Beatles davam ao estilo pessoal em suas diversas fases, todas marcantes do ponto de vista do styling. Mas isso é só o começo: o veterano arrisca mais que a média dos seus pares no português, faz gracinhas fofas, lê direitinho o texto no teleprompter, celebra Jimi Hendrix (“Foxy Lady”), faz duplinha com o baterista esquisitão bem-humorado Abe Laboriel Jr., manda a braba na hora de demonstrar afeto pela atual esposa, Nancy Shevell (com quem casou em 2011), entoando “Getting Better” com direito a sinal de coração feito com os indicadores e polegares. E ainda se refere a John e George como “manos”. Como se não bastasse, volta no final, para o medley do bis, empunhando bandeiras da Inglaterra, Brasil e LGBTQIAP+.
Assim como Madonna, McCartney revela ter feito direitinho o dever de casa, o que nem precisaria considerando sua trajetória. Poderia deitar e rolar na fama, mas é esperto. Por isso chegou onde chegou: ao longo do show, segura quase sempre os hits dos Beatles para privilegiar as composições que criou à frente do Wings, criando expectativa para guardar o melhor para a reta final quando emenda “Get Back”, “Let It Be” e “To live or Let Die” (com mix de projeções e explosões james bondianas) e terminando com “Hey Jude”.
* Por Alexandre Schnabl e Andrey Costa
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