Há uma ressaca na moda que fala de essenciais sem incorporar na prática o que, de fato, é essencial. Uma bolsa? Uma t-shirt? Uma modelagem? Bem, considerando que cada um desses elementos pode ganhar um preço nada justo para uma peça denominada “essencial”, restou à Semana de Moda de Paris, que terminou na última terça-feira (7/3), maquiar a tendência da vez e reinterpretá-la com a pecha deluxe que, no final, é o pano de fundo. Nada de tênis sujo e detonado ou regata picotada que viram hits e virais instantâneos nas redes sociais. Sorry, Balenciaga! Mesmo retomando o caminho do design atraente e de fácil penetração, o estigma da roupeca feita para alardear ainda está presente e as marcas e o público que compra moda demonstram querer distância disso.
Entre os cavalos e peles fakes de Stella McCartney e o brilho ganancioso de Alexander McQueen, a PFW enveredou por coleções que não divagam para além de si e buscam, cada uma em seu tema, uma solução para um prêt-à-porter que convença na proposta ao invés da embriaguez fashion que leva o(a) consumidor(a) a delirar na hora da compra, sem fazer um juízo do real valor a pagar. Tempos de economia em busca do próprio eixo também, mas sem esquecer que o desejo seguirá em alta, mesmo que venha pautado no essencial! Sendo assim, confira o Top 5 destaques do Ás na Manga, que fez questão de apontar quem não deu PT na rodada de moda parisiense que apresentou o outono-inverno 2023.

Stella McCartney
Facilmente uma das melhores coleções de Stella McCartney nos últimos anos. Embalada pela verve vegana, que atinge seu ápice em uma colação inspirada no universo equestre e afins, a estilista mostrou peles, penas, couro (de cogumelo!) e fez tudo parecer tão sedutor ao ponto de não nos importarmos se é real ou não. E, mesmo sabendo que é tudo fake, não gerou o desconforto generalizado que assolou militantes nas redes, como na última coleção de alta-costura da Schiaparelli. Com uma alfaiataria imponente, algo que ela apenas pincelava nas coleções, o guarda-roupa ganha um peso, mas com propostas mais desconstruídas. Os prints e bordados de cavalos também deixam tudo mais leve, assim como os vestidos de alcinha ou ombro só, que Stella costuma revisitar do próprio acervo.

Chloé
O estilo bohemian chic segue vivo na Chloé, mas ganha pegada mais política pelas mãos de Gabriela Hearst. A estética, impressa precisamente por Karl Lagerfeld entre 1964-83 (até a entrada do estilista na Chanel), é agora apresentada em tecidos de origem sustentável, outra máxima presente no DNA da estilista uruguaia. Carregadas de força, as peças trabalham couro, peles, seda, renda e buscam uma fluidez dentro desse espectro da mulher implacável. Com a maestria que Hearst na concepção de uma modelagem intelectualizada, até as peças que surgem herméticas, demonstram utilitarismo e fácil penetração no dia a dia.

Alexander McQueen
Sarah Burton é daqueles designers que entende o propósito que serve e não faz questão de se render aos algoritmos que catapultam criações de estilistas jovens ao patamar de ícones-fashion da noite para o dia. Para o inverno 23 de Alexander McQueen, ela exercitou os elementos que rodeiam a maison, alçando-os, naturalmente, a um patamar de destaque. Entre os brilhos pretensiosos, que surgem em equilíbrio com a alfaiataria desconstruída da marca, as chances dessa coleção dar as caras nos próximos red carpets da vida são altas. Com silhueta ajustada e alguns volumes opulentos, corpetes sustentam vários looks, sejam vestidos e alfaiataria, ou vestidos de alfaiataria, por que não? Uma injeção de ânimo nada afetado em uma das marcas mais sedutoras a cruzar a passarela francesa.

Valentino
Na Valentino de Pierpaolo Piccioli o clima é dramático e nada fake! Numa reviravolta do que vinha sendo apresentado, o designer aposta no universo rock para conceber seu inverno 23. Com a gravata sendo o tema principal, vestidos, camisas, casacos, suéteres e outras peças, são arrematados pelo acessório ressignificado. Quem disse que o look arrumadinho não pode ser repensado para a correria cotidiana do trabalho, faculdade e até para festa? Na sequência, a cartela de cor em preto, branco e vermelho, chama atenção pelos elementos do emocore — estilo musical que ditou a moda, música e o comportamento entre os jovens há 18 anos e segue repescado vez ou outra —, sendo finalizada com alguns verdes, o amarelo e o rosa. Com camisas que se transformam em vestidos longos, casacos emplumados e algumas transparências, outra tendência para a estação, temos a Valentino resgatando sua identidade como marca facilmente adaptável a novos consumidores.

Schiaparelli
Já ficou redundante elogiar a Schiaparelli. Afinal, ÁS estava lá na hora de alfinetar a excessiva tentativa de requentar elementos que são senso-comum quando falamos da Schiaparelli de Elsa Schiaparelli (leia aqui). E também vimos nascer esse fenômeno fashion e midiático que se tornou a marca sob o comando de Daniel Roseberry. Pois é, em uma temporada em que o essencial vira pauta devido ao Recession Core que falamos na última Semana de Alta Costura de Paris — a mesma em que o estilista foi tirado para Cristo por botar cabeças de animais ultrarrealistas em sua apresentação —, é no mínimo corajoso uma coleção que anule os efeitos em manada que partem de fora e foque apenas na criatividade e no savoir-faire dos ateliês. Vale destacar a atenção dada ao buraco da fechadura, que surge em decotes, sapatos, botões e até numa clutch preta com o objeto em dourado, capaz de deixar curioso até o menos entusiasta da etiqueta. Afinal, ainda vale a pena espiar o que a Schiap tem a oferecer!

*Por Andrey Costa
Foto destaque: Divulgação
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