Com circo armado na Praia de Iracema, em Fortaleza, o DFB Festival tem vocação para abraçar o street style. Natural, considerando que, enquanto maior plataforma de moda autoral da América Latina, o evento privilegie a moda jovem. Afinal, muitas vezes é nas tribos júnior que surgem tendências, quase sempre afinadas com aquele comportamento transgressor que tanto caracteriza tanto o streetwear quanto a verve autoral, sobretudo quando falamos de estilistas que não são necessariamente novatos (ao contrário), mas carregam na alma esse mood. Caso de Lindebergue e Kallil Nepomuceno, veteranos de tantas edições. Durante os dias da semana de moda, era comum ver turmas de adolescentes, por exemplo, circulando pelos corredores da tenda portando skates não nos pés, mas nas mãos – passaporte para que pudessem adentrar no festival sem serem barrados, ao lado de integrantes de tantas tribos. Aliás, as turmas agênero e trans também tomaram democraticamente o badalo, sublinhando o caráter plural do evento criado por Claudio Silveira e Helena Silveira. Sinal dos tempos.
Baba
Não há como não babar com a Baba, grife de Gabriel Baquit em sua segunda apresentação no DFB. O publicitário, que passou antes pela Água de Coco, soube sobreviver à pandemia. Quando esta surgiu, não havia nem um ano que ele havia posto para jogo a label, repleta de estampas fofas e colorido espertíssimo para incrementar modelagens quase normcore, em resultado serelepe. Aposta firme de Claudio Silveira, que acredita piamente na potência do garoto.
Com o esporte como inspiração, o rapaz, ao lado de Roberto Albuquerque, investiu em hoodies gostosíssimos para eles, segundas peles noventinhas e saias-envelope (ou longuete) para elas, e tubinhos embalados à vácuo para todos, porque, afinal, a fronteira entre sexos virou demodê. Tudo descomplicado na modelagem (bem basiquete), mas incrementado pela programação visual, ponto forte da label. Tyvek prata e couro idem, com corte a laser, são destaques, assim como acessórios bacanudinhos no styling: oclões translúcidos bem new wave, bolsas em pelúcia verde menta, profusão de buckets, brincos e colares produzidos com placas-mãe de computador, num exercício cyberpunk praiano.
Na trilha, “Starman“, do David Bowie, perfeitinha para essa moda com cara de sideradinha, cujo show teve como ponto alto um beijo à la Kim Kardashian no MetGala 2021. Nem camisinha sabor cosmopolitan é tão hype…







Sherida
A praia street de Sherida Livas ganha, por ela mesma, a alcunha de design selvagem no instagram da marca. Tem a ver. Com trilha dos anos 1970, sua passarela perfilou um panorama de gatinhas agrestes, daquelas que não abrem mão do sol, mas também não embarcam na vibe lolita lollipop. São meninas cheias de atitude, super poderosas e empoderadinhas, como manda o figurino.
Este, aliás, carrega nos prints gráfico-tropicais (e optical), oferece hot pants sobre leggings ou long johns e abusa de babados. No radar, telas lisas em maxi volumes repolhudos contrastam com as estampas. E vestidos curtinhos bem sixties são revisitados em modelagens que parecem complicadas, mas não são. Truque de styling bom, que privilegia maxi brincos. Portanto, anote o nome: é Sherida, quérida!








David Lee
Carro-chefe do street style no DFB, o enfant terrible David Lee costuma aprontar mais no masculino, mas suas coleções também trazem looks femininos. Dessa vez, ele gruda no artista plástico Narcélio Grud, que se graduou em design de interiores, mas embarcou na arte urbana pela capital cearense, pichando muros para depois imergir na arte cinética, na esteira de expoentes como Abraham Palatinik. As peças cinéticas do artista não só viraram cenários ou adereços dos modelos como inspiraram o estilista na cartela de cores sucinta (amarelo, laranja e vermelho, mais preto e branco) como viraram estampas e aplicações.
As formas secas da coleção dão asas ao crochê agora mais suave, menos pesadão que o da última edição. Ao som de traquitanas ao fundo (que alude ao movimento das obras de Narcélio), os modelos desfilaram montações caprichadas (como sempre!), com destaque para listras e madras e também, para os hoodies – o tipo de peça que o estilista curte por pra acontecer. ÁS quer tudo.






Vitor Cunha
Assim como Baba, Vitor Cunha apresentou com primor/fervor/louvor sua segunda coleção presencial no evento. Novo talento despontado na última edição física, em 2019, ele causou agora ótima surpresa com seus macramês arretados. Agora, o impacto cresce alguns graus na Escala Richter, sacudindo o DFB. Seu trabalho amadureceu, permanece cheio de conceito, mas bem mais usável, revelando o amadurecimento do moço.
Vitor ai se preparando a cada dia para levantar voo. O ceu é o limite. E, por isso, na semiótica da moda, a nova coleção do moço traz como inspiração a libélula. Assim como David Lee, ele investe majoritariamente no masculino, mas também oferece boas soluções para as meninas. Boas, mas definitivamente, o feminino não é seu ponto forte. O rapaz é daquele tipo que desenha roupa pensando nele mesmo, naquilo que ele usaria. Sua visão de moda vem dessa premissa, da vontade de redesenhar o estilo masculino à sua imagem e semelhança. Assim, ele vai aos pouco fincando os pés nesse segmento. Ainda assim, suas mulheres têm lá o seu valor.


Banana Urbana
Hoje é dia de rock, bebê! A Banana Urbana é recém-nascida. Tem um ano só de vida, mas já vem trabalhada na atitude rock star, apesar de se intitular uma marca de tropical denim. Esse espírito roqueiro, portanto, cai muito bem com a exuberância da coleção, inspirada na pequena notável Carmen Miranda. Dá gosto ver uma jovem label caindo de cabeça num dos nossos maiores ícones exportação. A brazilian bombshell transcende décadas, está cima do bem e do mal pela sua significação e potência. E o mix de irreverência e empoderamento atravessa gerações. Assim, é delicinha a grife de Paulo Rabelo e Josenias Junior mal acabar de sair do forno apostando, na sua primeira passarela, nesse arquétipo aprovado universalmente.
Porém, o chicachicaboom não é literal, nem reproduz, através de truques de styling, a figura icônica da atriz/cantora/personalidade. A marca prefere imergir sem obviedades na personalidade transgressora de Carmen – uma das primeiras gatinhas praianas da Zona Sul carioca, nos anos vinte – para estilizar esse códigos bem longe da semiótica esperada. Por exemplo, nada de turbantes retirados dos looks de baiana usados no palco do Cassino da Urca ou na série de filmes que a portuguesa vertida em brasileira da gema estreou na Twentieth Century Fox.
No lugar, surgem peças em amarelo banana, metalizados em ouro, correntes, colares de bolas, maxi brincos pendurados, prints de estrelas (do camarim ou do calçadão da fama), estampas tropicalistas de folhagem ou então um padrão corrido com fotos antigas da artista, em preto sobre preto. Caroon papa, caroon papa!










*Por Alexandre Schnabl
Foto destaque: backstage Sherida. Nicolas Gondim/Divulgação
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