* Por Fátima Telles

Basta falar sobre “Éramos Seis”, romance de Maria José Dupré, de 1943, para ver a reação de carinho pela obra. Clássico da produção televisiva nacional, a atração é envolvente, cria de cara empatia por abordar várias situações familiares ainda atuais. A trama tornou-se inesquecível, faz pare da história da tv, do imaginário de várias gerações. Não por acaso, a obra está ganhando agora mais uma adaptação, a quinta na TV. A Globo, lança no próximo dia 30 de setembro, às 18h, uma nova versão que traz em seu elenco a força de Glória Pires como a protagonista Lola, papel que, na última adaptação, coube à Irene Ravache. Dessa vez, o núcleo central é formado por Glória (Lola) e Antonio Calloni (Julio) e seus quatro filhos: Danilo Mesquita (Carlos), Nicolas Prattes (Alfredo), André Luiz Frambach (Julinho) e Giullia Buscacio (Isabel).

“Éramos Seis”, pela quinta vez! Sucesso ao longo dos anos, a adaptação televisiva do livro de Maria José Dupré atravessa as décadas e chega à Globo no próximo 30 de setembro,às 18h (Foto: TV Globo / Divulgação)

Na mesa da figurinista de “Éramos Seis”, Labibe Simão, o moodboard com a pesquisa de looks impressiona (Foto: TV Globo / Divulgação)

O livro teve sua primeira adaptação para a TV em 1958, pela Record TV. Em 1967 e 1977 a Rede Tupi trouxe novamente a história e anos depois, em 1994, foi a vez do SBT, numa realização que foi responsável por fazer despontarem dois talentos que eclodiriam como potências na telinha, ainda em papeis pequenos: Denise Fraga e Ana Paula Arósio.

Com Nicete Bruno e Gianfrancesco Guarnieri à frente do elenco, “Éramos seis” foi sucesso seminal na Tupi dos anos 1970, alguns anos antes da derrocada da emissora (Foto: Reprodução)

Em 1994,foi a vez do SB abraçar “Éramos seis”. A trama-família é uma espécie de talismã das emissoras quando toda vez que é preciso resgatar a emoção do público. Othon Bastos e Irene Ravache encabeçavam o elenco (Foto: Reprodução)

A história começa nos anos 1920, em São Paulo, no período final da República Velha, terminando nos forties, durante a Segunda Guerra Mundial, anos finais do Estado Novo. A família compra um casarão na Avenida Angélica, em São Paulo e Julio se esforça para pagar as prestações, trabalhando na loja de tecidos de Assad (Werner Schünemann) e ajudado pela mulher que costura para fora. Vai ser o maior tricô, literalmente.

“Éramos seis” apresenta ao público millennial aquele tipo de comércio que foi desaparecendo dos grandes centros urbanos nas últimas décadas, como as lojas de tecidos, engolidas pelo prêt-a-porter (Foto: Fátima Telles para Ás na Manga)

Pode preparar os lencinhos. É pura catarse: lacrimogênica como poucas produções da tv, tal qual a obra que a originou, a novela é do tipo que provoca lágrimas até nos atores, economizando quilos de cristal japonês à equipe de maquiagem. Em tempos de duras planilhas para reduzir custos,pode ser uma boa. Dessa vez, contudo, a autora Angela Chaves promete uma trama mais levinha. Para quem acha que conhece a história, não se espante: ela logo avisa: “Há mudanças, temos aqui uma livre adaptação da obra”, ela dá a deixa.

Olga ( Maria Eduarda de Carvalho ) e Zeca ( Eduardo Sterblitch ) são destaque em “Éramos Seis” (Foto: TV Globo / Divulgação)

Viagem no tempo

A cenografia tem participação especial para que o público entre no mundo de “Éramos Seis”. A década de 1920 inicia uma fase de ebulição em São Paulo, com movimentos como a Semana de Arte Moderna (1922). “Na virada para os anos 1940, vamos mostrar a cidade transformada. A direção fez pesquisa histórica e conseguiu muitos filmes da época, sobre o dia a dia de São Paulo. E como tudo era preto e branco, estamos colorizando”, explica o cenógrafo Fábio Rangel.

Passarela retrô: a Rua do Comércio criada por Fábio Rangel para a cenografia de “Éramos Seis” é repleta de referências fashion da época (Foto: TV Globo / Divulgação)

Passarela retrô: a Rua do Comércio criada por Fábio Rangel para a cenografia de “Éramos Seis” é repleta de referências fashion da época (Foto: Fátima Telles para Ás na Manga)

Vizinhança charmosa: casa da vizinha Genu ema “Éramos seis” (Foto: Fátima Telles para Ás na Manga)

Além dos cenários das casas de Lola, de Assad (dono da loja de tecidos), da Tia Emília, da Genu (a vizinha) e o de Afonso (dono do armazém), a atração conta ainda com o cabaré onde Julio trai a patroa com Marion (Ellen Rocche).

Money makes the world go round: Ellen Rocche incorpora o típico visual flapper em “Éramos Seis” (Foto: TV Globo / Divulgação)

E não é só isso: tem também a parte passada em Itapetininga, onde moram a mãe e irmãs da protagonista. Conheça alguns espaços:

Avenida Angélica e Rua do Comércio

Na cidadezinha cenográfica foram criadas duas ruas. A do Comércio, onde fica a loja de tecidos em que trabalha Julio, o bar e o bordel. Na Avenida Angélica se situa a casa de Lola.

O comércio de época ganha destaque nas tomadas externas de  “Éramos Seis” (Foto: TV Globo / Divulgação)

Hábitos de consumo do início do século 20 comparecem na narrativa de “Éramos Seis” (Foto: Fátima Telles para Ás na Manga)

 Casa de Lola e Julio

No livro “Éramos Seis”, não há muitos detalhes sobre o imóvel. “Para a televisão é preciso enriquecer a história”, explica o cenógrafo. “A inspiração vem das casas americanas da época”, comenta o cenógrafo, ressaltando que, na cidade cenográfica, existe apenas a casa (sem interior) e seu jardim. Em estúdio foram montados a sala de estar e jantar, jardim de inverno, cozinha, lavabo, escritório e a escada que vai para o segundo andar (onde ficam os quartos, que estão em outro espaço). “Cada capítulo tem 60% gravado na casa de Lola”, explica Rangel. 

A casa em estilo inglês, com leve piada vitoriana, é menina dos olhos da equipe de cenografia de  “Éramos Seis” (Foto: TV Globo / Divulgação)

Confira abaixo Em primeira mão os pormenores do requintado detalhamento da casa da família de Julio e Lola em ‘Éramos seis” (Fotos:  Raquel Cunha / Divulgação e Fáima elles para Ás na Manga):   

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“Éramos Seis” (Foto: TV Globo / Divulgação)

Espaços internos da casa de Lola

A decoração foi garimpada em antiquários e no acervo da Globo. Na sala de estar, os móveis foram comprados em Além Paraíba, na região do vale do café, em Minas Gerais. Duas pequenas estantes foram adquiridas para coleções de bibelôs, muito apreciados na época, espécie de memorabilia retrô para nerds da época. “Tem muito crochê e tricô, porque a Lola faz”, explica a produtora de arte Maria Rita Pancada.  Na sala de jantar, a mesa e cadeiras são art nouveau, em voga na época da narrativa. O papel de parede da casa de Lola teve inspiração nos usados nas residências americanas dessa década. “O desenho foi feito em computadorem tons de amarelo e laranja”, revela Fábio Rangel.

Olga ( Maria Eduarda Carvalho ) em “Éramos Seis” (Foto: TV Globo / Divulgação)

Loja de tecidos

Assad (Werner Schünemann), dono da loja, é de origem turca, daquela primeira leva de imigrantes do Oriente Médio que vieram para cá e se dedicaram à fabricação e importação de tecidos. Essa indústria cresceu muito na época. A casa de Assad ganhou móveis entalhados, mais pesadões, em estilo Renascença. Foram usados muitos objetos dourados na decoração, como manda o figurino da exótica cultura árabe.

Casa da Tia Emília

Susana Vieira é a tia amargurada e rica de Lola. Mora em São Paulo, num luxuoso casarão. Fábio Rangel dá a tônica do projeto cenográfico: “Sua casa é um palacete em estilo francês e a decoração utiliza móveis estilo Luiz XV”. 

Tia Emília ( Susana Vieira ) em “Éramos Seis” (Foto: TV Globo / Divulgação)

Figurino

Apesar de avançar por três décadas, a base da novela vai ficar nos anos 1930. Os twenties estão representados apenas nos primeiros 24 capítulos. O figurino dessa fase traz a desconstrução da forma da mulher pós-eduardina, com vestidos mais amplos no estilo flapper: cintura baixa, cabelos curtos, chapéu cloche e sapato de bico redondo. Segundo Labibe Simão, figurinista de “Éramos Seis”, foi difícil encontrar essas peças até em brechós. “Houve uma cena na estação de trem com 120 figurantes e foi desesperador: a solução foi confeccionar a maioria das roupas”, entrega a costume designer.

“Éramos Seis” (Foto: Fátima Telles para Ás na Manga)

A pesquisa de looks mergulhou fundo em filmes como Cabaret e a série Downton Abbey“, mas se baseou muito em fotos antigas também. Uma relíquia conseguida em São Paulo foi um vestido original, de linho cru, com frente e costas quadradas e cintura baixa. Luxo define. “Fizemos apenas pequenas intervenções com bordados e ainda aplicamos partes de guardanapos de boca bordados, usados na época”, revela Labibe.

“Éramos Seis” (Foto: Fátima Telles para Ás na Manga)

“Éramos Seis” (Foto: Fátima Telles para Ás na Manga)

Quanto ao figurino da década de 1930, como também se usava muita saia e blusa, com uma terceira peça de sobreposição, ficou bem mais fácil o garimpo,  principalmente nos brechós de São Paulo. “Os anos 1940 ainda não estão sendo trabalhados. Fizemos apenas para a gravação de uma chamada com a personagem Lola”, explica a figurinista.

“Éramos Seis” (Foto: Fátima Telles para Ás na Manga)

Acessórios

O chapéu mais usado nessa época – e o mais popular – era o cloche. Eles foram adquiridos em brechós ingleses e alemães, muitos deles fabricados nos Estúdios Globo. “uma loucura deliciosa”, se diverte Labibe. As bijuterias, relógios e joias também vieram do comércio second hand. Por sua vez, os sapatos são mais fáceis de encontrar:  em coleções de estilistas ou confeccionados especialmente para a novela.

A coleção de cloches e adornos de cabeça de “Éramos Seis” conta com peças em diferentes materiais (Foto: Fátima Telles para Ás na Manga)

Confira abaixo alguns visuais:

Lola (Glória Pires)

Nos anos 1920 ela usará estampas e muitas peças em tricô (que ela mesma faz), que também será aproveitado para os looks dos filhos ainda pequenos. Já nos anos 1930, a silhueta muda, com cinturas mais marcadas: ela vai usar aventais em casa.

Lola ( Gloria Pires ) em “Éramos Seis” (Foto: TV Globo / Divulgação)

Julio (Antonio Calloni)

Sisudão, o personagem vem no estilo masculino clássico, típico da burguesia que ascendeu na aurora da modernidade, no século19, e foi avançando pelo 20, se atualizando: peças “de homão” em cinza, vinho e marinho para a fase inicial. Nos anos 1930, o personagem ganha um visual mais soturno para pontuar o momento da doença.

Família de Lola de Itapetininga

Para caracterizar a simplicidade dessas pessoas, há mais misturas de texturas e cor.

Clotilde ( Simone Spoladore ) em “Éramos Seis” (Foto: TV Globo / Divulgação)

* Com artigos publicados nas principais revistas do país, blogs e sites, a jornalista tem bagagem em mídias digitais e content marketing, fazendo da delicadeza seu trunfo para extrair depoimentos das celebs. Mas não se deve confundir seu aspecto doce com serenidade. Amante de programas de viagem, a carioca é fogo! Sagitariana com ascendente em áries, defende as filhas com ímpeto de mãe-ursa – “elas são tudo para mim!” – e vai da água para o vinho: saboreia um suco de melancia na voracidade com que se entrega a churrascos.   

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